terça-feira, 25 de maio de 2010

Todos contra 1

Um acidente. Uma criança morre atropelada por uma lotação. Populares agridem o motorista. Clima de revolta na rua. Choro. Pai, mãe e irmã revoltados.
E o outro lado? Como fica?


Noite do dia 24 de maio de 2010. Décio Eduardo de Barros Vargas, de 26 anos, dirige o micro-ônibus da Cooperativa Consórcio Unicoopers pela Rua Roque de Mingo, região do Campo Limpo, zona sul de São Paulo. Ele faz a linha 746V, que liga o Jardim Rebouças a Santo Amaro. Há passageiros no coletivo, mas não sabemos ao certo quantos. Ao descer a rua, que na verdade é uma ladeira, se depara com uma criança em sua frente. Ele só ouve o barulho da colisão, pisa no freio, mas o veículo só vai parar cerca de 20 metros depois por causa do vácuo do sistema de frenagem. Rebeca Góis de Araujo, de 10 anos, morre na hora. As marcas da freada e do sangue da jovem ficam no chão. Os moradores agridem o motorista e quebram os vidros da janela do ônibus. O pneu dianteiro direito é furado. O massacre só não foi maior por causa da chegada da polícia.



Quando chego ao local, por volta das 2hs da manhã, e o clima é de desespero por parte de familiares e vizinhos. Muito choro e desabafo. Uma testemunha que entrevisto afirma que o motorista descia em alta velocidade, desviou de um ônibus e atingiu a menina que estava na rua, mas bem perto da calçada. Outros juram que viram uma mulher sentada no colo do motorista, enquanto o veículo descia em rapidamente. A mãe, revoltada, desabafa vários palavrões durante a entrevista e chora muito. O único mais racional é o pai, que “espera a decisão da justiça”.

Tudo contra o motorista, e claro, a situação nos comove. Por instinto, somos levados a acreditar apenas na versão que nos é apresentada naquele momento.

Mas, e a versão do motorista? Como fica nessa situação? Vamos à delegacia para tentar conversar com ele e com alguma autoridade policial. O delegado Fábio Antunes de Araújo nos atende e passa o que foi levantado por ele. “Duas testemunhas foram trazidas à delegacia para prestar depoimento. Uma – que estava na outra calçada – afirma que realmente a menina atravessou a rua e olhou apenas para um dos lados, quando tentou voltar já era tarde. A jovem não viu o ônibus que vinha do outro lado. A testemunha não soube afirmar sobre a velocidade do veículo. A segunda testemunha – e principal - é a namorada do motorista, que estava com ele na frente do micro-ônibus. A mulher disse em depoimento que o carro estava lotado e que ela realmente estava na frente, mas não conversava com o condutor. Além do mais, nega que estava sentada no colo, nem no motor do coletivo.”

Nesse momento o delegado fala algo importante, que às vezes passa despercebido nesse tipo de cobertura. “Eu fui ao local e comecei a colher os dados. Conversava com um e ele afirmava que o motorista estava em alta velocidade. Então perguntava: você estava na rua no momento do acidente? A resposta era não. Então, como você sabe que o ônibus estava rápido? Não sabia responder. Por isso não posso ir pela emoção, mas sim pela razão, sendo assim, trouxe para a delegacia apenas duas testemunhas”.



Logo depois o motorista topa dar entrevista e apresenta sua versão dos fatos. Ele confessa que estava conversando, mas dirigia devagar, no limite da via. Negou que estava desconcentrado. Disse que o ônibus arrastou a menina porque a lotação não parou instantaneamente. Afirmou que tentou prestar socorro, ligando duas vezes para o 190, mas foi impedido pelos populares de sair do coletivo. Se saísse, seria linchado.

Então, quem está com a razão? O resultado da perícia sai em 30 dias. Vamos ver...

* Com relato de testemunhas, polícia militar e civil e envolvidos no fato.
** Fotos de Eliezer dos Santos e Magrão CGP

Um comentário:

  1. Eu não testemunhei o acidente, mas pude presenciar o que se seguiu após o atropelamento, devido a proximadade da minha casa com o local do ocorrido.

    O atropelamento por si só foi um acontecimento muito triste e lamentavel, mas a selvageria que se seguiu me chocou tanto quanto o atropelamento.

    Sei que os familiares da vitima estavam agindo sob forte emoção, mas não somente familiares participaram da selvageria. Se o motorista está certo ou errado, eu não sei dizer, e não cabe a mim e a nenhuma das pessoas que estavam presentes julga-lo, isso cabe a justiça.

    Não estou defendendo ele, apenas acho que as pessoas não podem fazer justiça com as próprias mãos.

    Ontem logo após o acontecido, quando cheguei ao local, havia um homem batendo no motorista da lotação, depois este mesmo homem voltou com uma faca e se este motorista não tivesse fechado a porta do onibus ele a essa hora poderia ser outra vitima desse triste acidente. Este mesmo homem furou o pneu da lotação.

    A mãe da criança iniciou o quebra quebra, começando pelo retrovisor, depois com uma garrafa nas janelas, com o intuito de acertar o motorista e a cobradora que estavam dentro do onibus, e do outro lado várias pessoas jogavam pedras dentro do onibus.

    A mãe dessa criança inundada pela dor imensuravel que estava sentindo, não se atentou nem pelo fato de estar descalça em meio a tantos vidros, tamanho o desespero dela. Sou capaz de entende-la, mas não sou capaz de entender as demais pessoas, que num momento tão dificil deveriam manter o sangue frio e tentar esfriar os ânimos.

    Todas essas pessoas diziam estar fazendo isso para que o motorista não fugisse do local, mas ele em nenhum momento demostrou querer fazer isso, e num ato de desespero quando a quantidade de pedras era gigantescas, ele ligou o onibus para tentar fugir do massacre que poderia ter acontecido, quando finalmente a policia chegou, depois de inumeras chamada para o 190.

    Passageiros da lotação diziam que a criança atravessou na frente do onibus, eu não sei, como disse eu não estava presente, o que sei é que a rua é ingrime, no local do atropelamento é muito escuro, e a rua tem um movimento muito grande.

    Espero que Deus dê conforto a essa família e que esse motorista possa se recuperar de tão aterrador acontecido.

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